quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

As Institutas de João Calvino / Faculdade Presbiteriana


     Neste primeiro semestre de 2013 iremos estudar a disciplina As Institutas de João Calvino na Faculdade Presbiteriana Fatesul, localizada no bairro Tarumã, Igreja Presbiteriana.
     É possível participar como aluno ouvinte e também aluno de somente uma ou mais disciplinas, estudando a Palavra de Deus para mais perto de Deus estar e mais produtivo na sociedade atuar.
     As aulas iniciam no dia 25 de fevereiro e será possível acessar o material de estudo destas matérias neste blog. Bom estudo!
     Abraços, prof Ivan Ruppell Jr.


     AS INSTITUTAS DE JOÃO CALVINO - AULA 1/2 - Material de apoio

     "João Calvino nasceu em Noyon, a nordeste de Paris, em 1509. Educado na Universidade de Paris, dominada pelo pensamento escolástico, ele transferiu-se mais tarde para a Universidade de Orleans, de tendências mais humanistas, na qual estudou o Direito Civil. Embora, a princípio, se inclinasse para a carreira acadêmica, passou por uma experiência de conversão, por volta dos vinte e cinco anos, que o levou a tornar-se cada mais ligado aos movimentos de reforma em Paris, obrigando-o, posteriormente, a exilar-se na Basiléia.
     A segunda geração de reformadores tinha uma consciência muito maior que a anterior a respeito da necessidade de obras que tratassem da teologia sistemática. João Calvino, a grande figura do segundo período da Reforma, percebeu a necessidade de produzir uma obra que introduzisse, de forma clara, os fundamentos da teologia evangélica, justificando-os com base nas Escrituras e defendendo-os da crítica católica.
     Ele, em 1536, publicou uma pequena obra, com apenas seis capítulos, intitulada "As institutas da religião cristã". João Calvino, nos vinte e cinco anos posteriores, mexeu nessa obra, adicionando-lhe outros capítulos e reorganizando o material. À época de sua última edição (1559), a obra tinha oitenta capítulos e subdividia-se em quatro livros.
     O primeiro livro, tratava de Deus criador e de sua soberania em relação àquilo que havia criado.
     O segundo livro, trata da necessidade de salvação do ser humano e de como alcançar essa redenção por meio de Cristo, o mediador
     O terceiro livro, trata da maneira pela qual o ser humano se apropria dessa redenção, (...)
     Enquanto o último livro trata da igreja e de seu relacionamento com a sociedade.
     Embora, com frequência, insinue-se que a predestinação ocupe lugar central no sistema desenvolvido por João Calvino, isso não corresponde à verdade; o único princípio que parece nortear a forma como ele organizou seu sistema teológico é, por um lado, a preocupação de ser fiel às Escrituras e, por outro lado, a obtenção de máxima clareza na apresentação dos temas."
     (Alister E MCGrath - Teologia sistemática, histórica e filosófica - pág 103)

     "A obra de João Calvino, As institutas da religião cristã, tem sua origem na ala reformada da Reforma Protestante. A primeira edição, publicada em março de 1536, seguiu o modelo do "Catecismo menor" de Martinho Lutero, de 1529. Tanto sua estrutura quanto seu conteúdo indicam a dimensão com que João Calvino inspirou-se nessa grande obra educacional do reformador alemão antecedente (...)
     João Calvino, escreveu: "Meu objetivo nessa obra é preparar e treinar estudantes de teologia para o estudo da Palavra de Deus, para que possam ter um fácil ingresso no estudo dessa palavra e sejam capazes de lhe dar continuidade sem obstáculos".
     Em outras palavras, o livro pretende ser um guia para o estudo das Escrituras, funcionando como guia e comentário a respeito da profundidade de seus significados, que eram normalmente elaborados e complexos."
     (Teologia sistem, hist e filosof - p 111)
QUESTÃO AOS ALUNOS: Escreva 2 parágrafos acerca do formato e conteúdo do Catecismo menor de Martinho Lutero?

     "Uma nova preocupação com o método. Reformadores como Martinho Lutero e João Calvino tiveram um interesse relativamente pequeno em relação ao método. Para eles, a teologia voltava-se, sobretudo, à explicação das Escrituras.
     Na verdade, As institutas, de João Calvino, podem ser consideradas como uma obra de "teologia bíblica", que reunia as idéias básicas das Escrituras com uma apresentação sistemática. Entretanto, nos escritos de Teodoro de Beza, o sucessor de João Calvino na direção da Academia de Genebra (uma organização que treinava pastores em toda a Europa), pode ser vista uma nova preocupação com as questões metodológicas, (...) A organização lógica do material e sua fundamentação em pressupostos assumiram uma importância extraordinária."
     (página 115)
QUESTÃO AOS ALUNOS: Pesquise no livro, Teologia sistemática, histórica e filosófica - de Alister McGrath, na página 115, o significado da expressão "questões metodológicas"?

     "Não deixa de ser interessante o fato de que Calvino na medida em que escrevia os seus comentários da Bíblia, ampliava a sua Instituição da Religião Cristã - "obra prima da teologia protestante" - como resultado do seu aprofundamento bíblico, tendo em vista também os novos questionamentos de seu tempo. Neste sentido a sua teologia foi uma obra apologética, como, na realidade, deve ser toda a teologia.
     Aliás, a sua teologia nada mais era do que um esforço por comentar as Escrituras, por isso sua obra pode ser corretamente chamada de uma "teologia bíblica", certamente escrita por um teólogo sistemático que tão bem sabia se valer dos recursos da exegese e da hermenêutica, dispondo tudo isso de forma erudita e devocional. Por isso a história dos Comentários Bíblicos de Calvino e das sucessivas edições das Institutas se confundem e se completam. A sua exegese era teologicamente orientada e a sua teologia estava amparada em uma sólida exegese bíblica."
     (Herminsten Maia Pereira da Costa - Raízes da Teologia Contemporânea - páginas 142 e 143)



     AS INSTITUTAS DE JOÃO CALVINO - AULA 3 - Material de apoio


     Enquanto exposição da Verdade de Deus revelada na Bíblia, a obra As Institutas da Religião Cristã apresentam inicialmente o tema do conhecimento de Deus e do homem, os quais são relevantes à realidade humana dentro da reflexão calvinista. Neste processo o raciocínio do autor observa a razão da vida do homem a partir de uma vivência somente debaixo da vontade e dos desígnios de Deus. Quando a humanidade não permanece na presença de Deus nem na prática de seus princípios e na busca de desenvolver seus propósitos, se perde em grave engano existencial. Glória a Deus somente!
     Desenvolvendo este aspecto - Soli Deo Gloria, enquanto o tema orientador da exposição da verdade de Deus, Calvino irá escrever sua obra de teologia organizada a partir da escrita de 4 (quatro) livros, os quais compõe a edição definitiva das Institutas (1559).
     Primordialmente, já o primeiro assunto do Livro I, procura visualizar toda a percepção humana válida a partir de uma percepção primeira oriunda da Pessoa de Deus, o Criador: "A sabedoria verdadeira e substancial consiste quase inteiramente em duas coisas: o conhecimento de Deus e o conhecimento de nós mesmos." (Calvino, 1984, p 23).
     Ao propor certa singularidade ao ser humano, enquanto tanto o que deve ser conhecido como também aquele que irá conhecer a Deus, Calvino não retira de Deus a centralidade ou Glória. Ao contrário! A compreensão de quem realmente somos nasce exatamente do encontro primordial com Deus, junto de sua Criação ou Palavra revelada, pois, somente a partir daí apreendemos nossa verdadeira realidade - a de que somos seres humanos e criaturas de Deus.
     Esta realidade primeira de nossa existência - criaturas de Deus, define a possibilidade que temos acerca do conhecimento de Deus e de nós mesmos; pois somente o conheceremos além desta limitação de criaturas, exatamente a partir do que Ele mesmo desejar nos revelar - somos dependentes d´Ele: "Calvino insiste que a verdadeira sabedoria se encontra no conhecimento de Deus e de nós mesmos; é através do reconhecimento da nossa condição de pecadores que descobrimos que Deus é nosso Redentor." (2004, p 11 - A vida de João Calvino, A McGrath)
     Portanto, ultrapassar este olhar limitado de nossa humana natureza e enfim encontrar mais clara realidade acerca do Criador, somente será possível segundo determinação própria de Deus. Em consequência, surge a necessidade da mediação de Jesus Cristo para que a ação do Espírito Santo ilumine o homem. Eis o projeto essencial da "religião" - religação cristã que será terma de descrição no tópico: a ação de Deus enquanto salvador do homem. Somente apos ser iluminado pelo agir de Deus em sua mente e coração, e assim capacitado a compreender a Palavra divina bíblica pela Graça, é que o homem terá real conhecimento da Pessoa de Deus e das verdades que Ele assim nos quiser ensinar.
     Esta mediação de Cristo que irá livrar o homem de seu estado alienado de Deus é a religação - religião, do homem a Deus que Calvino desenvolve em seu livro segundo; em que nos faz conhecer a obra do Senhor como Redentor dos homens.
     TEXTO do prof Ivan - Doutrinas e Conceitos Teológicos Calvinistas - As Institutas


     Material de APOIO

     Deliberação humana e Providência Divina em Genebra.
     "Fé na providência", disse H.R. Mackintosh no início de suas conferencias sobre o assunto, "é um outro termo para religião pessoal. A ausência dela é um sinal de falta de religião pessoal." "Não é por acidente", escreveu Barth, "que a Reforma, com sua redescoberta da suficiência total da Pessoa e da Obra de Jesus Cristo, e da verdadeira adoração a ele por parte do homem pecador que pode se apegar à graça de Deus, e somente a ela, trouxe com ela, manifestadamente em todos os grandes representantes, Calvino não menos que Zuínglio e Zuínglio não menos que Lutero, um tipo de renascimento da fé cristã na Providência." Os escritos teológicos de Calvino sobre a questão da providência podem frequentemente ser lidos como um testemunho pessoal da fé que o sustentou na obra da sua vida. Ele continuamente encontrava conforto no fato de que "o Senhor tem todas as coisas em seu poder, controladas por sua sabedoria e que absolutamente nada pode acontecer que já não esteja ordenado... de maneira que nem o fogo, nem a água, nem a espada podem causar algum dano... exceto quando Deus, em sua infinita sabedoria, permitir que isso aconteça". (...)
     (...) Embora escrevesse com tanta certeza sobre o assunto, Calvino não sugeria que seria fácil para nós nem ficarmos firmes nem mantermos nossa fé na providência como ele a descreve para nós. Seremos tentados à perplexidade "quando o céu ficar coberto por densas nuvens". (...)
     (...) Contudo, a "providência de Deus como claramente exposta não ata nossas mãos", escreve Calvino. Ele destaca o elemento paradoxal na experiência daqueles que se sentem chamados por Deus para o seu serviço. Ainda que o "homem piedoso compreenda que é constituído como um instrumento da divina providência... ele cinge-se com entusiasmo porque está persuadido de que suas dores não são airosamente jogadas ao acaso. Na verdade, mesmo que "resultado de todas as coisas esteja escondido de nós, todos devemos aplicarmo-nos em sua causa, como se nada estivesse determinado sobre nada". Mesmo que saibamos que o resultado e a responsabilidade final por alcançarmos qualquer coisa está na mente e nas mãos de Deus, sentimos como que constrangidos e profundamente envolvidos numa aventura, como se também fôssemos responsáveis pelo seu sucesso ou por sua falha (...)
     (...) A confrontar o eleito com suas necessidades de tomar decisões, Deus parece investi-lo com sua própria liberdade e deixar sobre ele o ônus de usar todos os meios possíveis para que possa atingir seus alvos. A providência de Deus não isenta ninguém de ser prudente. "A providência de Deus nem sempre nos encontra em sua forma nua, mas Deus, num certo sentido, veste-a com os meios empregados." Contudo, "não devemos negligenciar as ajudas que podem ser legitimamente empregadas (...) Portanto, ele percebia que, na sua tentativa de ser vitorioso em Genebra, precisava ser tão sábio quanto uma serpente, enquanto tentava, ao mesmo tempo, ser humilde como uma pomba."
     (Calvino, Genebra e a Refoma - páginas 213 a 216, o Homem e sua Teologia; Ronald Wallace)


     Material de APOIO
     A Soberania de Deus, texto prof Ivan
     "Reconhecer que Deus é Soberano sobre todo o Universo e ser vivo, requer atentemos aos atos d´Ele em toda a Criação - Deus enquanto Criador de tudo; Deus enquanto Governador de tudo; e, Deus enquanto Redentor - salvando a criação do pecado. De tal forma que render-se à Soberania de Deus prescinde que conheçamos melhor o Criador em suas obras perante todas as coisas e seres.
     "A sabedoria verdadeira e substancial consiste quase inteiramente em duas coisas: o conhecimento de Deus e o conhecimento de nós mesmos" (Calvino, 1984, p 23). O método filosófico de Calvino a fim de que adquira conhecimento do homem e da criação origina em Deus - a partir d´Ele recebe o homem a definição de sua crença na existência do Deus vivo e criador. Trata-se de uma resposta bastante lógica e compreensível e, que faz-se norma ao raciocínio do renomado reformador. Afinal, em quê ou quem irá ele buscar parâmetros de conhecimento da realidade toda do mundo, senão perante Aquele que, cremos, tudo fez e todas coisas trouxe à existência (...)
     - continua , Material de Apoio.



     AS INSTITUTAS - AULA 5, Material de Apoio

     A mediação de Cristo livra o homem de sua alienação de Deus, religando-nos ao Criador em obra do Senhor Redentor, conforme irá desenvolver Calvino no segundo livro. Trata-se de revelar a realidade de quem somos e de como podemos conhecer a Deus, em ensino que recebemos do próprio Senhor. Por isso, um real conhecimento da pessoa de Deus e a oportunidade de uma existência humana satisfatória e verdadeira para com a vontade original do Criador - são um propósito e também uma realização divina na vida dos homens. Pois é o próprio Senhor Deus que visita o homem para revelar quão distante se encontra dos céus e também para promover reconciliação entre terra e céus, humanidade e Deus Pai.

     Esta visita e aproximação de Deus aos homens realizando obra de recuperação - reconciliação da humanidade à Pessoa divina, revela tanto o valor do homem quanto o caráter do Senhor. Deus é um humanista, e assim devem ser os cristãos: "O humanismo de Calvino, no entanto, não deve ser confundido com o "humanismo secular", que colocava o homem como centro de todas as coisas. Calvino rejeitava este tipo de "humanismo". Na sua obra Magna, A Instituição da Religião Cristã, Calvino expressa sua concepção "humanista", que consiste em reconhecer a grandeza do homem, como criatura de Deus, a Quem deve adorar e glorificar." (Herminsten, 2004, p. 97)

     É assim que a legitimidade do homem no conhecimento de Deus e de si mesmo encontra sua base de real entendimento: em Deus somente. Pois é de Deus a boa iniciativa e d´Ele a verdade acerca do que de real se pode conhecer - tanto do homem quanto de Deus. O conhecimento verdadeiro de Deus e de suas obras, inclusive o homem criado; jamais é verdade e sabedoria que o homem obtém a partir de si próprio. Este é um processo que requer submissão do homem a Deus, para que então se inicie o vislumbre do conhecimento acerca do Senhor Criador que os seres humanos podem obter - e especialmente, conhecimento acerca de si mesmos.
     A expressão "dar Glória a Deus" surge desta experiência: quando o homem apreende conhecimento que lhe propicia vivenciar experiências vivenciais; porém, reconhecendo que o entendimento ao conhecimento foi alcançado a partir de sua submissão e fé em Deus. Por isso, um conhecimento agora apreendido e tornado "do homem", e que afirma dele saber somente pela providência divina: Glória a Deus, portanto.
     Assim se diz, enfim, acerca da Redenção e Salvação dos homens: Glória a Deus! Pois posto que a manifestação desta realidade aos seres humanos é obra divina, mesmo quando dela temos conhecimento e grande experiência; sua origem e governo em nós é Obra suprema do Deus Redentor sobre os homens. Glória a Deus, pois.

     Os livros seguintes, III e IV das Institutas, permanecem desenvolvendo (..) (*continua)

     Texto, prof Ivan S Ruppell Jr

   



 MATERIAL DE APOIO / TEXTOS - Disciplina Institutas de João Calvino



João Calvino e a teologia missionária


Fora da igreja e entre estudiosos, para a surpresa de muitos que estão dentro da igreja, João Calvino frequentemente é visto com bons olhos. O gênio marxista, Leon Trotsky, que ajudou Lenin a criar a União Soviética a partir da Revolução Russa de 1917, afirmou que Karl Marx e João Calvino eram os dois maiores revolucionários em toda a história do Ocidente. Mas popularmente é comum depreciar a contribuição de Calvino, inclusive dentro da igreja, especialmente no que se trata da obra missionária. Não é raro pensar que João Calvino e o movimento que ele gerou não se interessaram pela obra missionária e pouco contribuiram para a reflexão missiológica hoje.
No início do século, o historiador da missão da igreja, o alemão Gustav Werneck, por exemplo, afirmou: “nós perdemos com os Reformadores não apenas a ação missionária, mas mesmo a ideia de missões… [em parte] porque perspectivas teológicas fundamentais deles evitaram que dessem a suas atividades, e mesmo a seus pensamentos, uma direção missionária”1.
Entretanto, muito pelo contrário e mesmo com toda a preocupação pela reforma da igreja na Europa, João Calvino contribuiu não só para o movimento missionário em si como também para a reflexão missionária que nutre o bom empenho missionário até os dias de hoje. Ele enviou centenas de missionários por toda a Europa e até ao Brasil. Não é um exagero atribuir-lhe o título de “pai da pensamento missionário protestante”.
Hoje queremos considerar a contribuição de João Calvino para a teologia de missão. No próximo artigo veremos a sua contribuição à ação missionária.
A teologia de missão
João Calvino não escreveu nenhuma “teologia de missão” ou reflexão a respeito da “missão” de Deus ou a “missão” da igreja. E nem podia. Afinal de contas até o século 16, a palavra “missão” era reservada para se referir à relação da trindade: a missão do Filho como o enviado do Pai e a missão do Espírito Santo como o enviado do Filho e do Pai2. Mas muito mais importante que isto, Calvino estabeleceu as bases bíblicas e teológicas para falar do papel da igreja na transformação da sociedade, e não apenas em termos locais, mas também em termos globais.
1.  “Missio Dei et missio Christi”. Fundamentalmente Calvino estabeleceu a base cristocêntrica e teocêntrica da missão. E deu forte apoio à evangelização através dos seus comentários. Calvino entendeu que, por meio de Cristo, Deus está atualmente reinando no nosso mundo. Veja, por exemplo, alguns dos seus comentários da Bíblia:
a) acerca de Isaías 2.4:
“a diferença entre o Reino de Davi, que era apenas uma sombra, e este outro Reino ... [é que] ... pela vinda de Cristo, [Deus] começou a reinar … na pessoa de seu Filho unigênito”.
b) acerca de Isaías 12.4-5:
“Esta exortação, pela qual os judeus testemunharam a sua gratidão, deve ser considerada o percursor da proclamação do evangelho, que depois seguiu na ordem certa. Como os judeus proclamaram entre os medos e os persas, e as outras nações vizinhas, o favor que era demonstrado para eles, assim, quando Cristo se manifestou, eles deveriam ter sido arautos para ressoar em alta voz o nome de Deus através de cada país do mundo. Portanto, é evidente qual seja o desejo que deve ser o tesouro de todos os piedosos. É que a bondade de Deus seja conhecida por todo e que todos se reunam no mesmo culto a Deus. Nós devemos ser especialmente possuídos deste desejo, depois de sermos libertos de algum perigo alarmante, e acima de tudo, depois de ter sido libertos da tirania do diabo e da morte eterna”.
c) acerca do Salmo 22.8:
“esta passagem, não tenho dúvidas, concorda com muitas outras profecias que representam o trono de Deus erguido, no qual Cristo pode assentar-se para comandar e governar o mundo”.
d) acerca de Miqueias 2.1-4:
“O reino de Cristo somente se iniciou no mundo quando Deus mandou que o evangelho fosse proclamado em todo lugar e... hoje o seu curso ainda não se completou”.
e) acerca de Ezequiel 18.23:
“Deus certamente nada mais deseja, para aqueles que estão perecendo e correndo para a morte, que retornem para o caminho da segurança. Por isso o evangelho é proclamado hoje por todo o mundo, porque Deus quis testemunhar por todas as épocas que ele se inclina grandemente para a misericórdia”.
f) e acerca de 1 Timóteo 2.4:
“Não há  nenhum povo e nenhuma classe no mundo que seja excluída da salvação; porque Deus deseja que o evangelho seja proclamado para todos sem exceção”.
O reino de Deus, por meio de Cristo, é a base nos escritos de Calvino para a sua missiologia implícita. Acerca de Isaías 2.2, Calvino comentou que haverá “progresso ininterrupto” na expansão do reino de Cristo “até que Ele apareça uma segunda vez para nossa salvação”. Uma das implicações deste reino presente é a destruição da distinção entre judeus e gentios e a necessidade consequente da proclamação dos Evangelhos entre todos os gentios do mundo. Isto também decorre da sua noção de eleição. Diante do governo de Cristo sobre toda a terra, há duas respostas: os repróbos negam o domínio de Cristo e até o atacam e os eleitos são “trazidos para prestar uma disposta obediência a Ele”. Nada poderá barrar o avanço do governo de Cristo. E a tarefa da igreja é pregar a Palavra de Deus porque “não existe outra forma de edificar a igreja de Deus senão pela luz da Palavra, em que o próprio Deus, por sua própria voz, aponta o caminho da salvação. Até que a verdade brilhe, os homens não podem se unir juntos, na forma de uma verdadeira igreja”3. Deus escolheu usar as pessoas como seu instrumento para pregar o Evangelho para todas as pessoas. O que motiva as pessoas a pregar o Evangelho é o zelo pela glória de Deus, a finalidade principal de toda a humanidade. Conforme Charles Chaney, “o fato de que a glória de Deus era o motivo primordial nas primeiras missões protestantes e isto ter se tornado, mais tarde, uma parte vital do pensamento e atividade missionárias, pode ser traçado diretamente em direção à teologia de Calvino”4. Assim, vemos a reflexão do Calvino que contribui significantemente para a teologia de missão hoje.
Algumas pessoas, entretanto, objetam, alegando que a teologia de Calvino levou obstáculos teológicos para o desenvolvimento posterior da missão da igreja. Apontam principalmente para a sua doutrina da predestinação e um suposto mau entendimento a respeito da Grande Comissão.
2. Predestinação. Alega-se, por exemplo, que a doutrina calvinista da predestinação faz a obra missionária irrelevante. Mas esta não é a lógica de Calvino que argumentava que o principal instrumento que Deus usava para salvar as pessoas era a pregação da Palavra de Deus:
“Embora ele seja capaz de realizar a obra secreta de seu Santo Espírito sem qualquer meio ou assistência, ele também ordenou a pregação externa, para ser usada como um meio. Mas para torná-la um meio efetivo e frutífero, ele escreve com seu próprio dedo em nossos corações aquelas palavras que ele fala em nossos ouvidos pela boca de um ser humano”5.
 “Deus não pode ser invocado por ninguém, exceto por aqueles que conheceram sua misericórdia por meio do Evangelho”6.
Porque o número dos eleitos é  desconhecido, cabe à Igreja pregar o Evangelho livre e irrestritamente a todos7. Logo a doutrina da predestinação em nada impede a tarefa missionária. Antes, a encoraja como dever da igreja em prol dos eleitos.
3. A Grande Comissão. É verdade que Calvino interpretou a Grande Comissão  como se referindo ao ministério apostólico do primeiro século. Mas não é verdade que Calvino entendeu que os apóstolos completaram a tarefa para fazer desnececessária a tarefa da evangelização contemporânea. Entendeu que os apóstolos completaram apenas o início da tarefa e que a evangelização do mundo continua uma tarefa para a igreja. Calvino, como os outros reformadores, era apenas contra a doutrina católica da sucessão apostólica e assim argumentava que o apostolado era um “munus extraordinarium” temporário que cessou com os doze. A Grande Comissão fazia parte deste argumento contra o catolicismo, mas não contra a evangelização mundial em si.
4. Missão integral. A dicotomia entre a espiritualidade e o engajamento social não é herança de Calvino, e sim de alguns dos seus seguidores em séculos posteriores.  Para Calvino, o discípulo de Cristo deveria seguir o evangelho no seu pensamento e por ações sociais e políticas8. Esta integralidade de pensamento missiológica é descrita pelo bispo anglicano, Robinson Cavalcanti, da seguinte forma:
“Do ponto de vista reformado, ou calvinista, o homem é um ser integralmente unificado. Deve-se evitar dicotomias. Tudo é esfera sagrada, e deve-se aplicar a Palavra de Deus a todas as áreas da vida. Toda a criação caiu com o pecado e está agora sob a ação redentora de Cristo, que é o Senhor tanto da Igreja quanto da sociedade. Os cristãos devem lutar hoje para manifestar a presença do reino de Deus, embora a sua plenitude somente se alcançará com o retorno de Cristo. Somos salvos para servir. Os cristãos devem se infiltrar em todas as esferas da sociedade para chamá-la ao arrependimento e à conformação às normas do reino. A Igreja é um centro de arregimentação e treinamento de pessoas que se reformam para reformar”9.
Para Calvino, o evangelho toca todas as áreas da vida humana e a igreja deve também exercer a sua missão em prol da transformação de pessoas e das suas instituições sociais, econômicas, políticas, etc. Justamente porque Cristo é Senhor sobre toda a vida, a Palavra de Deus desafia toda a vida humana. Ricardo Quadros Gouvêa afirma: “Calvino não visava em sua obra meramente uma reforma doutrinária e uma reforma da vida da igreja, mas também a transformação de toda cultura humana em nome de Jesus e para a glória de Deus.10” Não nos surpreende, então, que nos seus comentários, sermões, cartas e na sua obra-prima de teologia, “As Institutas”, encontramos a preocupação de Calvino com uma teologia que hoje denominaríamos de “integral”, isto é, com as implicações sociais do Evangelho na transformação completa de pessoas e do ambiente que as cerca11.
5. “Missão” na liturgia. Finalmente notamos a preocupação pela evangelização mundial repetidamente nas orações de Calvino. Segue um exemplo de uma oração assim escrita para o uso no culto dominical:
“Finalmente, oferecemos orações a ti, Ó Deus cheio de graça e Pai de todas as pessoas em geral, cheio de misericórdia, enquanto se agrada em ser reconhecido como Salvador de toda a raça humana pela redenção realizada por Jesus Cristo, teu Filho, para que aqueles que ainda são estranhos ao conhecimento dele, e mergulhados na escuridão, e são levados para o cativeiro pela ignorância e erro, possam, pelo teu Espírito Santo brilhando neles, e pelo teu evangelho ressoando nos seus ouvidos, ser trazidos de volta para o caminho certo da salvação que consiste no conhecimento de ti, o verdadeiro Deus e Jesus Cristo que tu enviaste12”.
Conclusão
Tudo isto mostra o quanto Calvino se preocupava com a missão da igreja e como ela fez parte importante da sua teologia e prática cúltica. Como veremos no próximo artigo, Calvino também se empenhava de modo prático e intenso na evangelização com muito êxito na Europa e dentro dos seus limites externos e internos no Novo Mundo.
Notas:
1. History of Protestant Missions, p. 9.
2. A terminologia de “missão” para se referir à evangelização dos povos (no caso, não-católicos) veio a ser usada somente no século XVI pelos jesuítas e carmelitas que começaram a enviar missionários ao Novo Mundo.
3. Comentário sobre Miquéias 4:1-2, citado em CHANEY, Charles. “The Missionary Dynamic in the Theology of John Calvin,” Reformed Review 17 (Mar. 1964): 28.
4. CHANEY, Charles Ibid., 36-37.
5. CALVIN, João. The Bondage and Liberation of the Will: A Defence of the Orthodox Doctrine of Human Choice against Pighius. Grand Rapids: Baker, 1996, 215.
6. CALVIN, João. Institutas da Religião Cristã, 3.20.12. Veja também 3:20.1; 3.20.11.
7. CALVIN, João. Institutas da Religião Cristã, 3.23.14.
8. BARTH, K. apud BIÉLER, A. O Pensamento Econômico e Social de Calvino,. trad. Waldyr Carvalho Luz. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1990. p. 29.
10. GOUVÊA, R. Q. A importância de João Calvino na teologia e no pensamento cristão. In: CALVINO, J. A Verdadeira Vida Cristã, p. 5.
11. BIÉLER, André, op cit. SOUZA DE MATOS, Alderi, “Amando a Deus e ao Próximo: João Calvino e o Diaconato em Genebra,” Fides Reformata 2:2 (Jul-Dez 1997), 69-88.
12. CALVINO, João. Tracts and Treatises Vol. 2:  The Doctrine and Worship of the Church. Grand Rapids: Eerdmans, 1958, 102.

É teólogo, missionário da Igreja Presbiteriana Independente, capelão d’A Rocha Brasil e surfista nas horas vagas. Pela Ultimato, é autor de A Visão Missionária na Bíblia eTrabalho, Descanso e Dinheiro. É blogueiro da Ultimato.



            EVANGELISMO CALVINISTA

A doutrina calvinista da Soberania de Deus se faz conhecer em nosso cotidiano através da Providência divina, a qual através da Graça comum capacita a humanidade a gerar uma cultura à existência dos homens na terra. O conhecimento deste soberano governo divino na história dos homens traz compreensão à possível interação entre idolatria humana e a Verdade de Jesus.
“O Calvinismo reconhece Deus no mundo: (...) colocando-se perante a face de Deus, ele tem honrado não apenas o homem por causa de sua semelhança à imagem divina, mas também o mundo como uma criação divina. Ao mesmo tempo o Calvinismo tem dado proeminência ao grande princípio de que há uma graça particular que opera a salvação e também uma graça comum pela qual Deus, mantendo a vida do mundo, suaviza a maldição que repousa sobre ele, suspende seu processo de corrupção, e assim permite o desenvolvimento de nossa vida sem obstáculos, na qual glorifica-se a Deus como criador.” (Abraham Kuyper, Calvinismo, editora cultura cristã, páginas 38, 39)
A afirmação de que a origem da criação e também do homem e sua cultura está em Deus, implica um olhar e relacionamento entre o cristão e o mundo terreno que é distinto da usual separação santo – maldito ou, religioso – secular que nos apresenta a perspectiva romana e evangélica comuns.
No livro, Calvino e sua influência no mundo ocidental (Cultura Cristã), explica Knudsen: "(...) para Calvino, diferentemente do que ocorria com outros líderes da Reforma, não existe dicotomia básica entre o Evangelho e o mundo, entre o Evangelho e a cultura...” (o Calvinismo como uma força cultural, artigo). Conclue, ainda, Kuyper: “(...) E para nossa relação com o mundo: o reconhecimento que no mundo inteiro a maldição é restringida pela graça, que a vida no mundo deve ser honrada em sua independência, e que devemos, em cada campo, descobrir os tesouros e desenvolver as potências ocultas por Deus na natureza e na vida humana.” (Calvinismo, p 40)
Pensando pra evangelizar, podemos refletir que o mundo dos homens não deve ser já declarado condenado pelo pecado que nele há; nem também a cultura que nele revela o agir humano deve ser afirmada inicialmente maldita. Isto porque nem o mundo  criado por Deus e nem a cultura gerada pelo homem, originaram do pecado.
Ao contrário, a natureza e a capacidade do homem de existir e gerar cultura tem origem na “mão” de Deus. A partir deste princípio é possível afirmar que até a busca do religioso e as construções humanas de relacionamento místico tem base original na Pessoa de Deus Pai. Pois a capacidade do homem de empreender artes e conhecimentos, ainda que em direções contrárias a Deus, não deixa de ser um dom comunitário divino à humanidade. Calvino: “Sabemos, sem nenhuma dúvida, que no espírito humano há, por inclinação natural, certo senso da Divindade (...) Até a idolatria no serve de grande argumento em favor desta ideia. Porque sabemos quanto o homem tem se humilhado, contra si mesmo, e em seu detrimento tem prestado honra a outras criaturas (...) Logo, os próprios ímpios nos servem de exemplo de que algum conhecimento sobre Deus existe universalmente no coração dos homens.” (Institutas, vol 1 cap 1, o conhecimento de Deus, p 57 – 59)
Portanto, os princípios doutrinários calvinistas da Soberania de Deus – Providência divina – Graça Comum, direcionam a reflexão e o desenvolvimento pela Igreja de Jesus de um evangelismo natural e espontâneo; pois evangelismo que relaciona a cultura do homem àquele que a criou, Deus Pai. A espontaneidade e naturalidade estão no fato de que o “evangelismo” deverá integrar e aproximar o homem a Deus, servindo-se exatamente das obras da cultura humana. Pois, ainda que observadas distantes e contrárias a Ele, permanecem um potencial divino dado à existência humana na Terra.
Esta surpreendente integração da cultura humana, até idólatra, à verdade revelada que afirma ser Deus o senhor de toda existência humana, surge em análise da missão paulina na Atenas do primeiro século. (Atos 17) Neste texto acompanhamos o evangelista Lucas apresentar o relato dos diálogos que foram base do anúncio do evangelho de Jesus aos homens naquela localidade idólatra.
Neste propósito, Iniciamos meditação acerca do evangelismo em Atenas percebendo como o apóstolo, prontamente se dirige ao centro urbano repleto de deuses, para vê-los tanto em locais públicos e comerciais como ainda em santuários diversos. Logo depois está envolvido em bate papo diário com os supersticiosos e religiosos múltiplos, a fim de aprofundar-se nas novidades. Desenvolve, mais tarde, relacionamento com os que só desejam a felicidade sensual ou junto dos que acreditam na mãe natureza e num deus que se confunde com a criação.
Ainda junto a Paulo, aproveitamos pra conhecer os fiscais de ensino das novas religiões, e isto lá no centro de debates alternativos idólatras, o areópago. E lá mesmo observamos o anúncio que faz acerca de Deus Pai, citando-o a partir de existência conjunta no altar dos doze deuses, aproveitando pra direcionar ao Senhor de Israel os louvores a zeus, conforme cantavam os poetas gregos Epimênides e Arato.
Nesta breve análise, devemos reconhecer que a prática evangelística do Apóstolo Paulo não se permite governar a partir do princípio que pressupõe a condenação da cultura do homem, como pressuposto de valorização da cultura do evangelho. Distintamente, pode-se propor um diálogo que bem relaciona a cultura existente à sua origem e propósito. Tal princípio notamos na experiência paulina em Atenas, posto que o raciocínio do apóstolo apresenta o evangelho integrando-o à cultura humana, exatamente afirmando que a origem desta tanto está em Deus quanto debaixo de seu governo permanece; mesmo quando a enxergamos já mui corrompida.  
Finalmente, como o propósito do Evangelho de Jesus é restauração de tudo que há e salvação de todo que crê, é preciso concluir o processo relacional de aproximação entre cultura do homem e o propósito original de Deus.
Assim esclarece Knudsen (p 14) quando expõe o entendimento calvinista:  “ (...) ao mesmo tempo, ele (Calvino) não aceitava simplesmente, sem critica, as realizações do gênio humano. Sua atitude exigia que tais realizações fossem analisadas quanto às razões que as inspiravam, pois deviam estar sujeitas aos preceitos de Cristo.” Calvino: “Ora, se todos nós nascemos com este propósito de conhecer a Deus (...) ficará manifesto que os que não dirigem a essa meta todas as cogitações e ações de sua vida declinarão e serão abatidos da ordem da criação. Isso não foi ignorado nem pelos filósofos, pois outra coisa não entendeu Platão, tendo ele ensinado muitas vezes que o supremo bem da alma é a semelhança com Deus (..) Igualmente Grilo argumenta com grande sabedoria em Plutarco, afirmando que se a religião fosse eliminada da vida dos homens, eles não somente deixariam de ter qualquer excelência acima dos animais irracionais, mas também de muitas maneiras viriam a ser muito mais miseráveis.” (Institutas, p 62)
E nesta busca do propósito reto que somente a redenção divina promete e alcança, Paulo esclareceu aos estoicos que o Deus de Israel não era mãe natureza, mas sim, o Criador de tudo que existe. Também anunciou, tanto aos estoicos que concebiam um deus criador e ora ocioso, quanto aos epicureus que viam a vida e destino enquanto obra do acaso; que foi Deus Pai mesmo quem planejou e agora governa os tempos e lugares da existência da humanidade. Para que em tempo oportuno sejam por Jesus, encontrados, “bem que não está longe de cada um de nós”, diz Paulo.
E conforme a pastoral tradução bíblica de Eugene Peterson: “o desconhecido é agora conhecido e está pedindo uma mudança radical de vida. Ele estabeleceu um dia em que toda a raça humana será julgada, e tudo será acertado. Também já indicou o juiz, confirmando-o diante de todos quando o ressuscitou dos mortos.” (Atos 17.31)
Enfim, o estudo do evangelismo ministrado por Paulo e o conhecimento das calvinistas doutrinas apresentadas, indicam-nos um princípio de anúncio do evangelho que precisa se unir aos outros, também bíblicos que já conhecemos.
A postura do apóstolo Paulo ao anunciar o evangelho integrando-o à cultura humana sob os auspícios do agir Soberano do Deus Criador, propõe uma palavra de redenção pela aproximação ao invés de palavra de condenação pelo desprezo.
É preciso reconhecer que sentimentos e valores, atos e conhecimentos do homem, sua cultura neste mundo - mesmo que ora contrários a Deus, também d´Ele surgiram enquanto possibilidade e potencia. Esta verdade acerca de toda vida que há na terra é fundamento, tanto de absoluta humildade a todos os homens, quanto de um evangelismo mais espontâneo e natural; pois o anúncio da redenção irá indicar prontamente um retorno do que ora somos ao que originalmente éramos: filhos de Deus Pai!
Foi este o evangelismo de Deus Pai enviando Jesus ao planeta dos homens e igualmente o evangelismo do apóstolo Paulo visitando Atenas da Grécia. E até João Calvino percebeu, tanto que a complexa, mas didática doutrina da Soberania de Deus, ele concebeu. Doutrina que nos orienta, a partir do conhecimento da providência divina e graça comum, a reconhecer que tudo que há e existe está mais perto dos designíos Senhor do Universo do que comumente compreendemos. 
                               Texto do Prof Ivan S Ruppell Jr, pastor presbiteriano

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Teologia Bíblica / Faculdade Presbiteriana Fatesul

   
      Neste primeiro semestre de 2013 iremos estudar a disciplina Teologia Bíblica na Faculdade Presbiteriana Fatesul, localizada no bairro Tarumã, Igreja Presbiteriana.
     É possível participar como aluno ouvinte e também aluno de somente uma ou mais disciplinas, na busca de conhecimento para mais perto de Deus estar e mais produtivo na sociedade atuar.
     As aulas iniciam dia 25 de fevereiro e será possível acessar o material de estudo neste blog. Bom estudo!
     Abraços, prof Ivan Ruppell Jr.


     TEOLOGIA BÍBLICA - AULA 1 - Material de apoio

     INTRODUÇÃO
     "Por "teologia bíblica", entendo aquele ramo da teologia cuja preocupação é estudar cada segmento das Escrituras individualmente, especialmente quanto ao seu lugar na história da revelação progressiva de Deus. A ênfase de tal estudo recai sobre a história e o segmento específico.
     Por "teologia sistemática", entendo aquele ramo da teologia que visa elaborar o todo e as partes da Escritura, demonstrando suas conexões lógicas (não apenas históricas), dando pleno conhecimento à história da doutrina, ao clima intelectual e às categorias e indagações contemporâneas, tendo sua base de autoridade final nas Escrituras, propriamente interpretadas. Teologia sistemática lida com a Bíblia como um produto pronto.
     Estas definições não evitam superposição: a teologia bíblica precisa ser sistemática, mesmo que focalize o lugar e o significado históricos de um segmento específico da Bíblia; e a teologia sistemática, se depender de exegese honesta, deve forçosamente depender de considerações históricas (...)
RESUMO DE ESTUDO: - Teologia Bíblica - estudar segmentos da Bíblia individualmente - acerca de seu lugar na história da revelação progressiva - ênfase: história e segmento específico.
Teologia Sistemática - organiza todos os livros da Bíblia, em suas conexões lógicas - expondo o conhecimento doutrinário - o conhecimento e entendimento intelectual do contexto histórico das doutrinas - debaixo da autoridade das Escrituras.
QUESTÃO AOS ALUNOS: "Estas definições não evitam superposição... - Qual o significado desta frase?
     Warfield oferece uma analogia que, a despeito de seus limites, vale a pena repetir:
     - O trabalho imediato da exegese pode ser comparado ao trabalho de um oficial de recrutamento: da massa de cidadãos, ele seleciona os homens que vão constituir o exército. A teologia bíblica organiza tais homens em companhias, regimentos e batalhões, dispostos em ordem de marcha e equipados para o serviço. -
     A teologia sistemática combina tais companhias e regimentos, formando um exército - um todo único e singular determinado por seu próprio princípio abrangente. Tal exército também é formado por homens, os mesmos recrutados pela exegese, mas em seu relacionamento devido aos outros homens de suas companhias e regimentos e batalhões. (...)
     (Unidade do Novo Testamento e Teologias bíblica e sistemática)
     (...) Por exemplo, se for argumentado que um autor ou livro é incoerente devido a alguma omissão, redação posterior, incorporação de fontes incompatíveis, ou qualquer coisa semelhante, é impossível desenvolver uma teologia bíblica daquele segmento das Escrituras (...) Semelhantemente, a possibilidade de se desenvolver uma teologia sistemática depende de determinar que nenhum dos livros do NT é incoerente (seja tal coerência demonstrada em categorias lógicas, históricas, funcionais ou quaisquer outras). Se houver uma incoerência intransponível, então a disciplina "teologia sistemática" pode permanecer, mas nenhuma teologia sistemática como produto final será possível (...)
     - Donald A Carson, Teologia bíblica ou Teologia sistemática, páginas 25 a 29 -
QUESTÃO AOS ALUNOS: Escreva um parágrafo acerca da coerência bíblica das teologias bíblica e sistemática e sua importância para a existência das citadas "teologias"?

     TEOLOGIA, o termo - AULA 2
     "A palavra "teologia" pode facilmente ser decomposta em duas palavras gregas: theos (Deus) e logos (palavra). Portanto, a "teologia" é discursar sobre Deus, mais ou menos  da mesma forma que a "biologia" é discursar sobre a vida (do grego: bios).
     Se existe um único Deus e se esse vem a ser o "Deus dos cristãos" (para empregar uma frase de Tertuliano, um escritor do século II), logo, daí decorre o fato de que a natureza e o escopo da teologia se encontram relativamente bem definidos: a teologia representa a reflexão a respeito do Deus a quem os cristãos louvam e adoram.
     Contudo, o cristianismo surgiu no contexto de um mundo politéista, em que a crença em muitos deuses era bastante comum. Parte da tarefa dos primeiros escritores cristãos parece ter sido distinguir o Deus dos cristãos dos outros deuses que havia no contexto religioso (...)
     Com o passar do tempo, o politeísmo veio a ser considerado como algo ultrapassado e um tanto primitivo. A suposição acerca da existência de um único Deus, em que este era considerado idêntico ao Deus dos cristãos, tornou-se tão difundida que, até o início da Idade Média na Europa, parecia algo patente, que dispensava provas ou explicações. Assim, Tomás de Aquino, ao desenvolver sua argumentação em prol da existência de Deus, não considerou necessário demonstrar que o deus, cuja existência ele provara, era o "Deus dos cristãos": afinal, que outro Deus havia? Provar a existência de Deus representava, por definição, provar a existência do Deus cristão.
     Dessa forma, a teologia era vista como a análise sistemática da natureza, dos propósitos e da ação de Deus. Em sua essência, encontrava-se a crença de que a teologia representava uma tentativa, ainda que inadequada, de falar sobre um ser divino, distinto dos seres humanos.
     Embora inicialmente o termo "teologia" significasse a "doutrina de Deus", o termo adquiriu sutilmente um novo sentido, nos séculos XII e XIII, à medida que a Universidade de Paris começou a se desenvolver. Era necessário encontrar uma designação para o estudo sistemático, de nível universitário, voltado à fé cristã.
     A expressão latina theologia, sob a influência de escritores parisienses como Pedro Abelardo e Gilberto de la Porree, passou a significar "a disciplina da ciência sagrada" que abrangia a totalidade da doutrina cristã, e não somente a doutrina de Deus.
     Um desdobramento posterior ocorreu mais recentemente. Até a época do Iluminismo, em parte como uma espécie de reação ao surgimento da sociologia e da antropologia, o foco da atenção havia se deslocado de tudo o que estivesse fora do alcance da investigação humana, como Deus, por exemplo, para voltar-se ao estudo do fenômeno da religião. Os "estudos religiosos" ou o "estudo das religiões" representam a área do conhecimento voltada à investigação de questões religiosas - como, por exemplo, as crenças ou as práticas religiosas do cristianismo ou do budismo.
     Com isso, ocorreu uma modificação no significado do conceito de teologia (...) Logo, embora a Teologia fosse certa vez tida como discurso sobre Deus, ela agora havia se tornado uma mera análise de crenças religiosas - mesmo que essas crenças não se referissem a deus algum, ou se referissem a diversos deuses, como no panteão hindu.
     Até mesmo a bem-intencionada definição de teologia do teólogo John Macquarrie, da Universidade de Oxford, é ligeiramente vulnerável nesse aspecto: "A teologia pode ser definida como o estudo que, por meio da participação e da reflexão a respeito de uma crença religiosa, busca expressar o conteúdo dessa fé por meio da linguagem mais clara e mais coerente possível."
     (...) "A teologia é a ciência da fé. É a explanação e a explicação consciente e metódica da revelação divina, recebida e compreendida pela fé." (Karl Rahner). (Alister E MCGrath - Teologia, sistemática, histórica e filosófica, páginas 175- 177)

     Este brevíssimo passeio histórico acompanhando o desenvolvimento do significado do termo "teologia", já nos prepara para o entendimento do significado da disciplina "Teologia Bíblica"; pois qualquer tema que venhamos a estudar tem  sua origem e orientação em meio aos pensamentos surgidos na história do estudo da revelação cristã. Isto é compreensível. Porém, nos cabe tanto recordar e ressaltar tal fato, quanto - importante, reconhecer quando e como na história do pensamento cristão o termo "teologia" se fez reconhecer pela expressão "teologia bíblica".
     Como explica Donald A Carson, "teologia bíblica" se entende enquanto "aquele ramo da teologia cuja preocupação é estudar cada segmento das Escrituras individualmente, especialmente quanto ao seu lugar na história da revelação progressiva de Deus." (Teologia Bíblica ou Teologia Sistemática, p 26 e 27).
     Então, inicialmente, deve-se reconhecer na história do pensamento cristão quando é que o interesse pelo estudo do texto e contexto das Escrituras se expressou através do termo "Teologia"; a fim de aprofundar tal entendimento no objetivo de anotar o contexto histórico que gerou o conteúdo peculiar ao que veio ser considerado "teologia bíblica".

MATERIAL DE APOIO - Conceitos, Teologia Bíblica


“Teologia bíblica é aquele ramo da teologia exegetica que lida com o processo da autorrevelação de Deus registrada na Bíblia.
Na definição dada, o termo “revelação” é tido como um substantivo que indica ação. A teologia bíblica lida com a revelação como sendo atividade divina, não o produto final dessa atividade. Sua natureza e método de procedimento terão, naturalmente, de manter estreito contato e reproduzir, até onde possível, as características do trabalho divino em si. (...)

“O nome é muito abrangente, pois, à exceção da revelação geral, supõe-se que toda teologia esteja embasada na Bíblia. (...) O fato é que a teologia bíblica, tanto quanto a teologia sistemática, faz que o material passe por uma transformação. A única diferença está baseada no princípio no qual a transformação é conduzida. No caso da teologia bíblica, o princípio é histórico; no caso da teologia sistemática, o princípio é de natureza lógica. Ambos são necessários e não há nenhuma situação em que um se ache superior ao outro.

Método da Teologia Bíblica
“O método da teologia bíblica é, predominantemente, determinado pelo princípio da progressão histórica, daí a divisão do curso da revelação em certos períodos. Qualquer que seja a tendência moderna quanto a eliminar o princípio da periodicidade da ciência histórica, permanece como certo que Deus, no desdobramento da revelação, empregou esse princípio com regularidade. Disso segue-se que os períodos não deveriam ser determinados de maneira aleatória ou segundo preferências subjetivas; mas, estritamente, de acordo com as linhas de divisão delineadas pela própria revelação. A Bíblia está, como esteve, consciente do próprio organismo; ela sente, o que não podemos dizer sempre de nós mesmos, a própria anatomia. O princípio das sucessivas Berith-realizações (aliança ou pacto-realizações), como indicando a introdução de novos períodos, tem um papel importante nisto, e deveria ser cuidadosamente observado.”

A divisão da revelação especial redentora “berith” e “diatheke”
“Isso é o que na linguagem dogmática chamamos de “o pacto da graça”, enquanto que a revelação especial pré-redentora é comumente chamada de “o pacto de obras”. Deve-se tomar cuidado para não identificar o último com o “Antigo Testamento”. O Antigo Testamento pertence ao pós-queda. Ele compõe a primeira das duas divisões do pacto da graça. O Antigo Testamento é aquele período do pacto da graça que precede a vinda do Messias; o Novo Testamento compreende aquele período do pacto da graça que segue da sua aparição e sob o qual nós ainda vivemos.”

(Teologia Bíblica, Antigo e Novo Testamentos – Geerhardus Vos, páginas 16 a 38)



   "Teologia bíblica é aquele ramo da teologia exegetica que lida com o processo da autorevelação  de Deus registrada na Bíblia.
   Na definição dada, o termo "revelação" é tido como um substantivo que indica ação. A teologia bíblica lida com a revelação como sendo atividade divina, não o produto final dessa atividade. Sua natureza e método de procedimento terão, naturalmente, de manter estreito contato e reproduzir, até onde possível, as características do trabalho divino em si (...)

   (...) As várias coisas designadas em sucessão pelo nome de Teologia Bíblica
   O nome foi usado, primeiramente, para designar uma coleção de textos-prova empregados no estudo da teologia sistemática. Depois, foi acolhido pelos pietistas em seu protesto contra um método hiperescolástico no tratamento da dogmática. É claro que nenhum dos dois usos fez surgir uma nova disciplina teológica distinta. Isso não aconteceu até que um novo princípio de abordagem, que posicionava a questão fora da esfera das disciplinas já existentes, foi introduzido. O primeiro a fazer isso foi J. P. Gabler no seu tratado De justo discrimine theologiae biblicae et dogmaticae. Gabler percebeu, corretamente, que a diferença específica da teologia bíblica se encontra no seu princípio histórico de abordagem (...)

Princípios Orientadores
   a) o reconhecimento do caráter infalível da revelação como essencial a todo uso legitimamente teológico do termo. Isso é essencial ao teísmo. Se Deus é pessoal e consciente, então a inferência é inevitável de que em todo seu modo de autorevelação ele apresentará uma expressão impecável de

   b) a teologia bíblica deve, igualmente, reconhecer a objetividade da base da revelação. Isso significa que comunicações reais vieram de Deus ao homem ab extra (...) A crença na ocorrência conjunta da revelação objetiva e subjetiva não é uma posição estreita e antiquada; na verdade, ela é a única visão abrangente, uma vez que tem o desejo de levar em consideração todos os fatos. A ofensa com o termo "ditado" frequentemente procede de um menosprezo de Deus e uma hipervalorização do homem. Se Deus foi condescendente em nos dar uma revelação, compete a ele e não a nós determinar a priori que formas ela assumirá. O que devemos à dignidade de Deus é que haveremos de receber sua fala com pleno valor divino.
   c) a teologia bíblica está profundamente envolvida com a questão da inspiração (...) nosso conceito da disciplina considera o assunto do ponto de vista da revelação que procede de Deus. Portanto, o fator da inspiração precisa ser reconhecido como um dos elementos de considerável importância que conferem às coisas estudadas o caráter de "verdade" garantida a nós como tal pela autoridade de Deus... O conceito de inspiração parcial é uma invenção moderna, não tendo nenhum apoio no que a Bíblia ensina sobre a própria formação... Ainda mais, temos descoberto que a revelação não está, de maneira alguma, confinada a manifestações verbais isoladas, mas ela abrange fatos... Portanto, a não ser que a historicidade desses fatos seja garantida e que isso seja de uma maneira mais confiável do que o que é feito pela mera pesquisa histórica, os fatos, com o conteúdo do ensinamento, se tornarão sujeitos a um grau de incerteza, considerando o valor da revelação com totalmente duvidoso. A confiabilidade da exatidão das revelações depende totalmente da exatidão do ambiente histórico no qual elas aparecem.

(Teologia Bíblica, Antigo e Novo Testamentos, Geerhardus Vos, edit Cult Cristã, p 20 - 25)



   TEOLOGIA BÍBLICA - AULA 3 - Material de apoio

     - A evolução da teologia como disciplina acadêmica.
     Qual a origem histórica do termo "teologia" e como se tornou em currículo acadêmico?
     Foi no período patrístico que Clemente de Alexandria distinguiu "uma teologia" cristã da mitologia pagã e igualmente Eusébio de Cesareia fez uso do termo, ambos buscando apresentar uma visão "verdadeira" de Deus a partir exclusivamente do ensino cristão.
     A partir do século XII, a teologia tornou-se disciplina acadêmica na Europa Ocidental a partir do surgimento das universidades, pois quatro faculdades eram ensinadas: humanidades, medicina, direito e teologia. A partir do ensino básico das humanidades, os estudantes se desenvolveriam a partir da escolha de uma das três "faculdades superiores". Encontramos esta realidade no século XVI quando os reformadores Lutero e Calvino estudam "humanidades" na universidade antes de se dedicarem à teologia e direito, respectivamente. Este reconhecimento acadêmico da Teologia avançou na Europa Ocidental proporcionalmente ao surgimento de novas universidades no decorrer dos séculos.
     O conteúdo de estudo da disciplina teologia, a partir das escolas das catedrais e monastérios, referia-se mais a questões práticas da fé e espiritualidade. O estudo a partir das universidades gerou um maior interesse teórico da disciplina, como na Universidade de Paris, século XIII, em que teologia designava "a discussão sistemática das crenças cristãs em geral." A obra Summa theologiae, de Tomás de Aquino, século XIII, consolidou a palavra "teologia" como referente à disciplina teórica.
     A postura de Tomás de Aquino em afirmar a teologia como disciplina teórica provocou reações de Boaventura e Alexandre pelo esquecimento do estudo prático e também de Thomas à Kempis; que declaravam haver maior interesse na reflexão do que na obediência a partir dos estudos com ênfase teórica. Lutero e Calvino igualmente se preocuparam com as questões práticas da fé a partir do estudo teológico, sendo que Calvino fundou a Academia de Genebra no propósito de orientação prática ao ministério pastoral. Escritores protestantes posteriores desenvolveram mais a reflexão teórica do que o pensamento ministerial.
     O Iluminismo do século XVIII fez o meio acadêmico questionar o valor e propósito da disciplina "teologia" no estudo das universidades. A busca da verdade deveria ser objeto da filosofia, em uma pesquisa acadêmica sem base externa à reflexão; sendo que a teologia, porém, era baseada em "artigos de fé". Kant afirmou que disciplinas como teologia, medicina e direito deveriam ocupar-se somente de questões práticas, como ética e saúde.
     F D E Schleiermacher renovou o interesse da disciplina "teologia" a partir do propósito de bem instruir o clero da igreja. Schleiermacher desenvolveu a ideia de três áreas à teologia: teologia filosófica, histórica e prática, resultando em uma visão de que o estudo da disciplina seria de valor para a sociedade; perspectiva bem aceita na Berlim do século XIV mas, perspectiva progressivamente abandonada pelo secularismo ocidental.
     A exclusão da disciplina "teologia"do meio acadêmico fez-se realidade a partir do surgimento de universidades com princípios seculares de reflexão, ocorrendo a partir da Revolução Francesa em 1789 e avançando, por exemplo, em universidades da Austrália que surgiram a partir deste pressuposto intelectual secularizado.
     Atualmente, a disciplina "teologia" existe em meio ao valor de uma sociedade pluralista, como nos EUA; em que seu estudo acadêmico se desenvolver a partir do estudo das religiões, a fim de não gerar privilégio a um determinado credo e fé. Os Seminários tornaram-se o local privilegiado de estudo da teologia cristã.
     A partir da obra: Teologia, a fragmentação e unidade da educação teológica, de Edward Farley, 1983; a disciplina acadêmica "teologia" afastou-se da busca por um "conhecimento genuíno das coisas divinas". Há uma diversidade de disciplinas que necessariamente não apresentam coerência e unidade, se desenvolvendo de forma isolada. Ainda, o que surge atualmente é a ideia de uma "arquitetura da teologia", refletindo sobre a relação entre estudos bíblicos e teologia sistemática e entre esta e a teologia pastoral.
     RESUMO - Prof Ivan S Ruppell Jr - páginas 177 a 180, Teologia sistemática, histórica e filosófica, Alister E McGrath.


   TEOLOGIA BÍBLICA - AULA 4 - Material de Apoio

   Teologia Bíblica: conceitos e considerações
    "A melhor abordagem para o entendimento da natureza da teologia bíblica e o lugar pertencente a ela no círculo das disciplinas teológicas passa por uma definição de teologia em geral. De acordo com sua etimologia, teologia é a "ciência concernente a Deus"... Como um caso frequente, a definição de teologia pode ser examinada como a "ciência da religião". Se nessa definição "religião" deve ser entendida subjetivamente como significando a soma total dos fênomenos ou experiencias religiosas no homem... Se, entretanto, religião for entendida, objetivamente, como a religião que é normal e de obrigação para o homem porque é prescrita por Deus, então outra questão deve ser levantada: por que Deus exige precisamente essa religião e não outra? Portanto, em última instância, ao lidar com religião nos encontraremos lidando com Deus.
   Da definição de teologia como ciência concernente a Deus segue-se a necessidade de que isso se baseie em revelação. Ao lidar cientificamente com objetos impessoais, nós é que damos o primeiro passo... Mas com relação a um ser pessoal e espiritual a situação é diferente. Somente à medida que tal ser escolhe se expor é que podemos conhecê-lo... O princípio envolvido foi formulado por Paulo de maneira impressionante: "Porque qual dos homens sabe as coisas do homem, senão o seu próprio espírito, que nele está? Assim, também as coisas de Deus, ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus" (1Coríntios 2.11). O conteúdo oculto da mente de Deus pode ser possuído mediante o desvendar dessa mente, feito pelo próprio Deus. Deus precisa vir até nós antes que possamos ir a ele. Mas Deus não é um ser espiritual de forma geral. Ele é um ser infinitamente exaltado acima da nossa maior concepção (...)
   Outra razão para a necessidade da revelação que preceda todo o entendimento de Deus advém do estado anormal em que o homem existe no pecado. O pecado transtornou a relação original entre Deus e o homem. Isso produziu uma separação em que anteriormente prevalecia uma comunhão perfeita. Em razão da natureza da situação, todos os passos tomados na direção de corrigir essa anormalidade partiram da soberania divina."

(Teologia Bíblica, Antigo e Novo Testamentos, Gerrhardus Vos, edit Cultura Cristã, p 13, 14)
   


   TEOLOGIA BÍBLICA - AULA 5 - Material de Apoio

  "Uma nova preocupação com o método. Reformadores como Martinho Lutero e João Calvino tiveram um interesse relativamente pequeno em relação ao método. Para eles, a teologia voltava-se, sobretudo, à explicação das Escrituras.
     Na verdade, As institutas, de João Calvino, podem ser consideradas como uma obra de "teologia bíblica", que reunia as idéias básicas das Escrituras com uma apresentação sistemática. Entretanto, nos escritos de Teodoro de Beza, o sucessor de João Calvino na direção da Academia de Genebra (uma organização que treinava pastores em toda a Europa), pode ser vista uma nova preocupação com as questões metodológicas, (...) A organização lógica do material e sua fundamentação em pressupostos assumiram uma importância extraordinária."
     (página 115)

     "Não deixa de ser interessante o fato de que Calvino na medida em que escrevia os seus comentários da Bíblia, ampliava a sua Instituição da Religião Cristã - "obra prima da teologia protestante" - como resultado do seu aprofundamento bíblico, tendo em vista também os novos questionamentos de seu tempo. Neste sentido a sua teologia foi uma obra apologética, como, na realidade, deve ser toda a teologia.
     Aliás, a sua teologia nada mais era do que um esforço por comentar as Escrituras, por isso sua obra pode ser corretamente chamada de uma "teologia bíblica", certamente escrita por um teólogo sistemático que tão bem sabia se valer dos recursos da exegese e da hermenêutica, dispondo tudo isso de forma erudita e devocional. Por isso a história dos Comentários Bíblicos de Calvino e das sucessivas edições das Institutas se confundem e se completam. A sua exegese era teologicamente orientada e a sua teologia estava amparada em uma sólida exegese bíblica."
     (Herminsten Maia Pereira da Costa - Raízes da Teologia Contemporânea - páginas 142 e 143)


     A Dignidade da Teologia Bíblica a partir da Teologia Sistemática

     "Uma vez aceita a coerência interna de cada segmento, é possível desenvolver uma teologia bíblica para cada segmento e ainda assim deixar de encontrar o consenso necessário a uma teologia sistemática. Se, contudo, uma teologia sistemática for possível, a própria teologia bíblica assume uma nova dignidade, pois uma consequência da teologia sistemática seria a certeza de que os segmentos constituintes são coerentes, desde que corretamente organizados na estrutura histórica da teologia bíblica.
     Se as definições e relacionamentos que esbocei permanecerem de pé, segue-se que a legitimidade de buscar uma teologia sistemática depende da unidade do NT. A ampla diversidade existente não pode, portanto, envolver contradição lógica ou histórica. (...)
     (Teologia Bíblica ou Teologia Sistemática, Donald A Carson, p 29-30)



AULA 6 - TEOLOGIA BÍBLICA

     Uma teologia bíblica do Novo Testamento formalizou-se grandemente ao redor de reflexões, conflitos e encontros a partir do pensamento teológico protestante junto aos movimentos da Reforma, Pietismo e Iluminismo. Isto porque até meados do século 13 somente havia uma teologia dogmática, não bíblica, posto que se apoiava no propósito de bem ensinar as definições fundamentais do pensamento cristão. Estas declarações dogmáticas afirmavam o cânone essencial cristão a partir de reflexões apologéticas, sendo desenvolvido nos séculos primeiros e Idade Média enquanto exposição de doutrina eclesiástica "necessária" ao seu contexto; não enquanto exposição bíblica em sua completude.

     Especialmente na Idade Média esta exposição dogmática apoiou-se mais fortemente nas tradições eclesiásticas, pois o resguardo e testemunho da verdade cristã se fizeram reconhecer pela manutenção e proteção do pensamento cristão do cânone essencial. Enquanto os "reformadores" refletiram sobre o conteúdo do cânone dogmático eclesiástico com liberdade reflexiva desde o século 13, somente no século passado o pensamento cristão católico atuou de igual forma.

     "A Reforma não produziu a ciência bíblica protestante atual, mas deu-lhe a relevância objetiva." (pg 19). Lutero não criou uma ciência bíblica pura enquanto base de compreensão e exposição da verdade cristã, pois manteve e se baseou em tradições e símbolos de fé cristãos históricos. Porém, inverteu a perspectiva existente entre Escritura e tradição, transferindo para a Bíblia o veredito final sobre o texto verdadeiro e correto da Igreja.
     Lutero e a Reforma Protestante irão legar ao pensamento cristão a orientação básica de que a Escritura é o critério primeiro de compreensão e exposição da Verdade do Cristianismo. O princípio de interpretação orientador de tal proposta é "que a Escritura expressa o decisivo, de maneira clara, se for interpretada de acordo com a sua própria essência." (p 19) Isto ocorre quando a Escritura é interpretada pela Escritura e, quando a Escritura interpreta-se a partir de Cristo: "E nisso Cristo para ele não é uma sigla, mas o Cristo que conheceu na mensagem da justificação da carta aos Romanos e ao qual as comunidades da Reforma se confessavam magno consensu, nos Escritos Confessionais." (p 19)

     Mesmo refletindo a partir destes princípios, os reformadores primeiros e seus posteriores teólogos ortodoxos, não desenvolveram grandemente uma teologia bíblica; pois atuavam em busca de respostas concretas às indagações e necessidades de sua época. Posteriormente, os Pietistas conflitaram com a ortodoxia protestante rejeitando um nascente escolasticismo do protestantismo. Assim fizeram trazendo a Bíblia novamente ao centro da reflexão. Porém, permaneceram expondo mais uma dogmática bíblica (declarações objetivas e simplistas) do que buscando uma exposição da completude do texto bíblico.

     "Uma teologia bíblica surgiu apenas quando o princípio escriturístico da Reforma, na maioria das vezes sob modificação pietista, se chocou com o pensamento histórico do Iluminismo." (p 20) Foram padrões de interpretação iluministas que moveram o pensamento cristão a analisar os escritos bíblicos enquanto documentos históricos, de igual modo a documentos antigos outros. Mesmo que a interpretação histórica documental tenha se iniciado e desenvolvido à luz da filosofia dominante à época, o princípio de análise histórica documental gerou novo valor à função teológica.
     "... a Escritura não quer apenas transmitir uma alocução genérica de Deus, mas quer faze-lo numa determinada situação histórica. A Carta aos Romanos, p. ex., não é um tratado de caráter geral, mas foi escrita à comunidade de Roma numa determinada situação. É por isso que a pesquisa histórica da Escritura é exigida pela própria Escritura." (p 21)

     O princípio orientador para que uma ciência autônoma guie a interpretação bíblica está na utilização desta enquanto "desenvolvimento da pesquisa "meramente histórica" da Escritura." (p 21)

(Texto: Resumo prof Ivan / Teologia Bíblica do Novo Testamento, O Desenvolvimento da Pesquisa e a Problemática)